Antes de publicar o conto propriamente dito, gostaria de falar sobre atos falhos. Escrever também é um ato falho. O que não é dito e precisa ser dito vaza eventualmente, mesmo você sendo um escritor obsessivo e controlador (não é meu caso). Mas o mais interessante sobre atos falhos é que existe o desejo, e a vontade de dizer. Quando escrevi Supernova estava em um momento de interdição. Separada do cara que inspirou o texto. (Oi muso ;-)). Escrevi, revisei, e fiz uma leitura dele no soudcloud. Queria sentir como aquilo se manifestava na leitura. E curiosamente dois trechos mudaram sem que eu tivesse muito controle sobre isso. O mais significativo é no antepenúltimo parágrafo. No lugar de “Não duvida”, a ordem imperativa, com um ponto final encerrando a questão eu disse “Na duvida”, com uma vírgula separando a sentença.
O desejo da ausência de fim abusando na minha boa vontade. Você pode ler o conto abaixo e ouvir o áudio no link ao fim do texto.
Supernova
Parece invenção fantástica, livro latino, conto africano, moço, mas é só ciência. São fatos, que serão documentados com disciplina por um assistente enfadado – óculos, jaleco branco – em uma planilha com perguntas precisas sobre eu e você.
No relatório estará explicado como três dias puderam se tornar três vezes três vezes três vezes três vezes três vezes três. O tempo que acontece na paixão é quântico, está sob o jugo da super fluidez. O tempo que corre quando você segura meus ombros contra o portão de um estacionamento pós apocalíptico obedece a uma constante que obedece a um sistema instável que obedece a um conjunto de regras rígidas. Regras que misturam saliva e infinitude. Eu estava lá. Eu pude observar o fenômeno acontecer.
Primeira Lei de R.
Em um ambiente controlado por favor perca o controle, meu bem.
Segunda Lei de R.
Encontre inesperadamente a minha presença em sites de notícias.
Terceira Lei de R.
Apareça às sete da manhã disposto a beber meu sangue.
Não duvida. Te convido para ver o céu, as leis estampadas lá no alto ignoram a impossibilidade. Lentes sofisticadas, o Hubble não é nada perto do que posso te apresentar. E mesmo assim quanto tédio, apenas um salpicado de branco sobre o azul para aqueles que não podem enxergar – mas nós conseguimos, nós sabemos ver.
Podemos então, de forma cética e metodológica prever o futuro do nosso abismo, nossa trajetória de ascensão, queda e apagamento determinada por elementos infinitesimais – está nas apostilas, na enciclopédia, no google, nos quadros negros dos filmes sobre gênios indóceis e no livro do Barthes, que é filósofo mas ainda assim, o que absolutamente não me deixa mentir.
Basta então que você fique ao meu lado, é inevitável, é predeterminado, não fui eu, não foi você. Me escolha. Não saia. Não pisque. Não se mova. É de extrema importância não hesitar para ter o direito de ver, magnífica e assustadora, a explosão invisível da nossa Supernova.